domingo, 28 de junho de 2015

CAMARÕES


É normal que quando se conversa sobre camarões entre amigos e conhecidos, os eleitos sejam os espécimes de Moçambique, por um lado, as histórias e aventuras muitas vezes envoltas em mistério descrevendo as qualidades, quantidades e os petiscos que este crustáceo proporcionava, por outro, o facto de poder ser adquirido por valores irrisórios, tornando-se na maioria das ocasiões, um petisco a titulo gratuito nos bares e cervejarias.
Para aqueles que não são oriundos de Moçambique, mas, nem por isso menos informados através de terceiros, ou através da comunicação social, depois de provarem as nossas receitas de camarão, aprovam e recomendam.
Entre as várias especialidades, destaco duas, talvez as mais emblemáticas, que eram servidas em cervejarias um pouco por todo o país (Moçambique), sobretudo no litoral onde imperava o celebre camarão tigre, (habitualmente servido a 1 escudo a unidade) nas variedades frito ou grelhado nas brasas, tendo esta ultima alcançado uma tal fama que nós e os demais frequentadores tenhamos associado o nome da cervejaria ao “petisco”, i. é. “Camarão grelhado à Nacional”.
Depois deste passeio pelas origens, possibilidades gastronómicas e opções culinárias que o camarão nos proporciona, passemos então ao modo de confecionar as duas formas (fritos e grelhados) acima mencionadas.
Para o efeito, vou utilizar doses individuais de 6/8 camarões, fritos ou grelhados, que deverão ser amanhados conforme detalhe pormenorizado nas imagens, servindo para as duas receitas respectivamente:


Camarão frito:

- Depois do camarão devidamente amanhado prepara-se uma mistura de condimentos secos:
1 colher de chá de alho em pó
1 colher de chá de colorau
Sal e pimenta preta q.b.
Uma cerveja

Recheia-se o lombo dos camarões e rega-se com a cerveja, reservando-se por uma hora para que o camarão absorva os condimentos e de seguida fritam-se em azeite quente até que fiquem rosados dos dois lados. Retiramos os camarões e na mesma frigideira adicionamos uns quantos alhos picados e duas ou três colheres de sopa de manteiga com o resto da marinada de cerveja. Pica-se grosseiramente um molho de coentros frescos envolvendo os camarões, regando-os com o molho ainda quente.
Mais uma vez recomendo individualmente uma boa dose de piripiri ao gosto.


Camarão grelhado:
- Amanha-se o camarão como na receita anterior, com a particularidade de espalmarmos os camarões de forma a ficarem totalmente abertos. De seguida arrumamo-los num tabuleiro temperando-os com o mesmo tipo de condimentos da outra versão, deixando-os a marinar em cerveja por umas horas. Mais tarde, dispõe-se os camarões numa grelha tipo prensa (como as de assar sardinhas) e vão de preferência ao fogareiro de carvão. Podemos também grelha-los igualmente em qualquer outro tipo de grelhador.

Relativamente aos molhos de acompanhamento podemos optar pelo molho da receita anterior ou em alternativa o tradicional molho de manteiga com um pouco de limão ao gosto.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

TOCOSSADO


Ao dar início à receita, sinto a necessidade de fazer uma série de considerações não menos pertinentes, começando desde já pelo nome, origens e sobretudo as fusões a que este prato foi sendo sujeito ao longo do tempo. Sabendo da localização geográfica de Moçambique, país banhado no seu extenso litoral pelo oceano Indico (Rota das Especiarias) e da sua ocupação multicultural, étnica e racial, ocorrida e documentada nos últimos cinco séculos, fez com que o Tocossado (água e sal, denominação original na zona norte; Ilha do Ibo até à zona da Zambézia com povos de origem árabe e de religião muçulmana) tenha sofrido alterações no que diz respeito à introdução e exclusão de alguns condimentos conforme as zonas, como por exemplo, no norte e centro do território onde as influências árabes conduziram à inclusão de algumas especiarias e acompanhado pelo imprescindível arroz de coco. Relativamente ao sul, também com uma forte presença muçulmana e sobretudo em meados do séc.XVIII com uma crescente e influente comunidade chinesa, indo-portuguesa e europeia, o Tocossado tomou um aspeto, como de uma sopa de peixe se tratasse, com requintes de exotismo tropical.
Depois de uma exaustiva pesquisa junto de familiares e amigos e mais recentemente em alguns sítios na internet, experimentando algumas receitas, cheguei à conclusão de que o modo como a minha mãe fazia, era o que mais me agradava, tendo ela, introduzido o gengibre fresco, o que, quanto a mim, acentua o sabor do peixe. Presentemente acrescentei à receita da minha mãe, o molho de soja, obtendo assim uma receita com um toque pessoal. 
Passemos então à receita do Tocossado para 4 pessoas e os Ingredientes são:

4 postas médias de corvina ou outro peixe semelhante,
 2 a 3 cebolas médias,
 2 a 3 tomates maduros ou 4 colheres de polpa de tomate,
 3 dentes de alho,
 gengibre fresco, q.b.
 1 colher de sopa de molho de soja
 Uma colher de sopa de óleo vegetal.

Num tacho largo de preferência de barro deita-se o óleo, a cebola picada em meia-lua, o alho, 4 a 5 lascas de gengibre, o tomate grosseiramente picado e finalmente as postas de peixe. Tempera-se com sal e pimenta ao gosto e vai ao lume normal. Quando começar a ferver adiciona-se o molho de soja, cobre-se com água e põe-se em lume brando tapado deixando cozer entre 30 a 45 min. Serve-se com arroz branco ou arroz de coco e para os mais atrevidos como eu, não dispensamos uma boa selecção de piripiris caseiros, preparados como os indicados em anteriores publicações (6 e 7 de Junho).
Bom apetite.

domingo, 14 de junho de 2015

VINDALHO


A divulgação da receita que se segue só faz sentido se recuarmos até finais do séc. XV, aquando da chegada e fixação dos portugueses a Goa, cidade, situada na costa sul da Índia.
Durante todo o complicado processo de colonização, cheio de vicissitudes inerentes ao isolamento a que se viram votados os portugueses, de duvidosa proveniência, que viajaram nas naus portuguesas, na sua grande maioria degredados e de baixa condição social, os quais, eram tratados pelas tripulações, como animais de carga e lastro no périplo africano. Alimentando-se na maioria das vezes, com pouco mais de restos e sobras das tripulações, tais que, fariam corar qualquer mendigo das vielas de Lisboa.
Quando chegaram à Índia, os infortunados viajantes, famintos, observaram estupefactos a abundância de vacas, porcos e outros animais que deambulavam livremente pelas praias e ruelas das aldeias indianas, seguindo o seu instinto de sobrevivência, os recém desembarcados abateram para comer, alguns animais, sob o olhar de reprovação e nojo do povo local, estes, habituados que estavam a uma dieta sobretudo vegetariana, só esporadicamente, comiam carne de aves, peixe ou mariscos, provenientes do extenso e rico litoral do Índico, para além de que, a religião que professavam, hindu, maioritária na região, não permitia a utilização de carne de vaca, por esta ser considerada um animal sagrado, apenas, podiam consumir leite e seus derivados. Quanto ao porco, era considerado um animal impuro, mas, com a conversão do povo local ao cristianismo, foram ultrapassados certos tabus e preconceitos milenares relativamente ao consumo de certas carnes.
Posto isto, e numa primeira fase, a carne de porco era confecionada à boa maneira portuguesa, em vinho e alhos, posteriormente, passou a ser misturada e refinada com especiarias e temperos, dando-lhe outra identidade, mas, continuando a manter a designação de vindalho, no entanto e localmente, a população denominava de vindaloo, especialidade que perdura até aos nossos dias, praticamente sem alterações.
Já em Moçambique, em meados do séc. XX, esta receita foi transmitida à minha mãe pelas colegas de origem goesa, dos tempos da escola da Munhuana em Lourenço Marques, atual Maputo, e por sua vez, a minha mãe passou-me a receita, quando mostrei interesse, não só pela sua degustação, como em confecioná-la, o que tenho vindo a fazer até aos dias de hoje, numa tentativa de apurar e adaptar a receita, cada vez mais ao paladar dos nossos dias.
Depois desta breve introdução, passo em seguida a descrever a receita com os devidos pormenores:
Para quatro pessoas pomos a marinar ½ quilo de carne de porco cortada em pedaços pequenos. Para a marinada esmagamos 6 a 8 dentes de alho com sal, 1 colher de chá de pasta de tamarindo (opcional), uma chávena de vinho e outra de vinagre, de modo a cobrir a carne, repousando durante um dia.
De seguida selecionamos as seguintes especiarias:
1 ½ colher de sopa de coentros em pó
½ colher de sopa de cominhos em pó
2 colheres de chá de açafrão das índias
1 colher de sopa de colorau
pimenta preta em pó
E ainda,
2 cebolas médias
3 colheres de sopa de óleo vegetal e sal q.b.

Modo de preparação:
Põe-se o óleo num tacho quente, frita-se a carne e reserva-se na marinada anteriormente preparada, de seguida, refoga-se a cebola previamente picada juntando as especiarias, e deixa-se apurar durante 20 minutos, podendo adicionar-se um pouco de água. Após decorrido os 20 minutos, adiciona-se a carne já frita e a restante marinada, mexendo sempre até levantar fervura, de seguida tapa-se o tacho e baixa-se o lume para o mínimo, até apurar e carne ficar macia e o molho espesso, retificando o sal ao gosto.
Acompanha com arroz branco solto ou de coco, não posso deixar de referir que a minha receita é bastante parecida com aquela que a minha mãe confecionava, a única diferença reside, na preparação da carne, onde o alho e o sal eram esmagados com malaguetas picantes. Quanto ao restante não há grande diferença.
A receita que apresentei pode e deve ser acompanhada com os respetivos chatinís.


segunda-feira, 8 de junho de 2015

PIRIPIRI, GINDUNGO OU PIMENTA DA TERRA E OUTROS PREPARADOS


Para além dos chatinis existem outros preparados com piripiris que habitualmente utilizo no acompanhamento tanto de peixe como de carne, sendo o seu modo de preparar, o seguinte:
No preparado mais comum, “universal”, utilizo 4 a 6 colheres de sopa de piripiri em grão, 1 a 2 dentes de alho, casca e sumo de ½ limão, sal q.b. e uma chávena de chá de óleo aquecido, triturando-se tudo, de modo a ficar um creme uniforme. Deixa-se repousar e utiliza-se ao fim de uma hora.
Para o achar de manga, recomendo a aquisição do tempero em embalagens, no Centro Comercial da Moraria ou em outra loja de produtos indianos. A dificuldade está por vezes na aquisição da manga verde, mas vale sempre a pena pela consistência da mesma no final da preparação, para a sua confeção, procede-se da seguinte forma:
Para 8 a 10 mangas verdes, depois de lavadas, cortam-se as mangas ao meio e colocam-se em salmoura por 24 horas. Decorrido este período de tempo, demolham-se por uma ou duas horas, com o objetivo de eliminar o excesso de sal.  Cortam-se as mangas em tiras finas longitudinalmente, e numa tijela, misturam-se essas tiras finas, conjuntamente com o conteúdo de uma embalagem de tempero para achar. Em seguida, aquecemos 1 litro de óleo e deixamos arrefecer até ficar morno, após o que se junta ao preparado, misturando tudo e deixando repousar por umas horas.
Depois da operação concluída, colocamos o achar em frascos e podendo ser consumido de seguida.
Para finalizar este pequeno périplo pelos domínios dos piripiris, apresento-vos o achar de limão/lima, este sim, de muito fácil preparação, para confecionar este tipo de achar, costumo utilizar a lima, porque possui uma casca fina e é quase sempre isenta de caroços, para a sua confecção deve seguir-se os seguintes passos:
Para 8 a 10 limas, em primeiro lugar, devemos golpeamos cada lima, 8 vezes, mas, sem a seccionar totalmente. De seguida, no meio, abrimos ligeiramente e deitamos no seu interior, uma colher de sobremesa de sal. Depois desta operação, colocamos as limas dentro de um frasco de boca larga e deixamos ao sol, durante 2 a 3 dias. Findo esse tempo, moemos 10 a 12 colheres de sopa de piripiri moído fino e adicionamos sumo de limão de modo a cobrir as limas e voltamos a colocar a mistura ao sol por mais alguns dias a fim da mistura curtir.
Quando o liquido estiver pastoso, o achar de limão/lima está pronto a ser consumido.


domingo, 7 de junho de 2015

PIRIPIRI, GINDUNGO OU PIMENTA DA TERRA E OUTROS PREPARADOS


Lembro-me de quando tinha cinco anos e a minha mãe um dia ter utilizado um dito que não é nada estranho ao pessoal da minha geração: “se dizes asneiras ponho-te piripiri na boca”, e eu levando à letra o que ela me dissera, nunca mais deixei de as dizer…
Voltando ao presente, ao longo de pouco mais de uma dezena e meia de postes tenho vindo frequentemente a referir o uso de piripiris e outros derivados, com o intuito de proporcionar uma experiência diferente através do aumento da temperatura corporal e um certo ardor na boca, o que para uns é extremamente desagradável,  para outros a utilização de picantes é indispensável. 
Se existe um vegetal, especiaria ou condimento digno de figurar no “Panteão” das glórias culinárias, essa distinção, vai sem dúvida para o Capsicum frutescens, vulgo, pimenta da terra, piripiri, gindungo etc…
Degustado nos quatro cantos do mundo, este vegetal com origem na Mesoamérica, foi trazido para a Europa por Cristóvão Colombo nos finais do séc XV e mais tarde, em meados do séc XVII, embarcado nas naus Portuguesas, percorreu a rota das especiarias no seu retorno, sendo prontamente adotado e cultivado pelos povos do sul da India (Goa), tornando-se na nova estrela da companhia e indispensável no acompanhamento e produção de novos pratos.
Existe o mito de que o caril é sinónimo de comidas extremamente picantes, confeccionadas com piripiris bastante agressivos, normalmente degustadas por pessoas com um palato fora do normal…        
No meu caso em particular, não tenho por hábito, preparar as refeições incorporando no preparado quaisquer picantes, salvo quando os convivas são todos amantes do mesmo. Respeitando a zona geográfica onde estou inserido e as pessoas que normalmente partilham comigo as diversas formas de caril tenho por costume, preparar à parte algumas misturas de piripiris, umas vezes secos em pó e outras vezes misturados com frutas tropicais e outros condimentos, denominados de Chatiní.
Das múltiplas variedades que já experimentei, vou exemplificar apenas três:


(1)    Chatiní de Cebola: 1 Cebola média cortada em ½ lua fina, sal q.b.,1 ou 2 colheres de chá de piripiri seco moído (bastante picante) e sumo de ½ limão.

(2)    – Chatiní de Tomate: 4 ou 6 tomates cereja assados no carvão ou no bico do fogão e esmagados, sal q.b. 1 ou 2 colheres de chá de piripiri seco moído (bastante picante) ) e sumo de ½ limão.

(3)    Chatiní Verde: 6 a 8 malaguetas verdes muito picantes trituradas com 1 ramo de coentros frescos, sal e sumo de ½ limão até ficar uma pasta.